Por Amir Labaki
Sem maiores surpresas e com as
esnobadas habituais, as indicações nesta semana para a 96ª. cerimônia de
entrega do Oscar, em 10 de março próximo, reafirmaram o compromisso da
Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood com maior
diversidade, inclusão e cosmopolitismo. No discurso de abertura do
anúncio, a presidente da Academia, Janet Yang, já frisava o recorde de
“votantes de 93 países” e apresentava a instituição como “a casa do
cinema mundial”.
A lista de dez concorrentes a
melhor filme inclui produções faladas em quatro línguas (alemão,
coreano, francês e inglês). A relação de indicados a melhor direção
ostenta cineastas de quatro nacionalidades. Os cinco finalistas a melhor
documentário de longa-metragem são produções rodadas fora dos EUA.
Como raramente na história, as
quatro categorias de interpretação ostentam diversidade étnica e, ao
menos nas duas categorias principais (ator e atriz), intérpretes
LBGTQIA+ vivendo personagens LGBTQIA+ (Colman Domingo, de “Rustin”, e
Jodie Foster, de “Nyad”). Com a indicação de Lily Gladstone, de
“Assassinos da Lua das Flores”, pela primeira vez uma protagonista de
origem indígena norte-americana concorre ao prêmio de melhor atriz.
Como esperado, o drama político
“Oppenheimer”, de Christopher Nolan, confirmou-se como o favorito do
ano, liderando no número de indicações (13). Seguem-se, concorrendo em
11 categorias, “Pobres Criaturas”, de Yorgos Lanthimos, “Assassinos da
Lua das Flores”, de Martin Scorsese, em 10, e “Barbie”, de Greta Gerwig,
em 8. É difícil justificar como as duas principais forças criativas da
comédia musical inspirada pela boneca da Mattel, a diretora Gerwig e a
atriz Margot Robbie, foram excluídas das disputas nestas categorias,
ainda mais quando indicadas pelos prêmios anuais dos respectivos
sindicatos (DGA e SAG), embora ainda disputem o Oscar respectivamente
por roteiro adaptado e como coprodutora de indicado a melhor filme.
A relação de preteridos não se
esgota naturalmente em Gerwig e Robbie. Sem juízo de valor, entre os
principais excluídos do ano, encontram-se Alexander Payne (Os
Rejeitados) como diretor, Leonardo DiCaprio (Assassinos) entre os
atores, três dos longas documentais originalmente posicionados entre os
favoritos, “Além da Utopia”, de Madeleine Gavin, “Jon Batiste: American
Symphony”, de Matthew Heineman, e “Still: Ainda Sou Michael J. Fox”, de
Davis Guggenheim, e animações da centenária Disney, como “Wish, O Poder
dos Desejos”, de Chris Buck e Fawn Veerasunthorn.
Vale contrapor algumas histórias
consagradoras, venha ou não o prêmio. Vencedor da Palma de Ouro de
Cannes 2023, o drama criminal francês “Anatomia de Uma Queda”, de
Justine Triet, arrebatou nada menos que cinco indicações: melhor filme,
melhor direção, atriz (Sandra Hüller), roteiro e edição. Também a cinco
Oscars, incluindo tanto o de melhor filme quanto o de melhor filme
internacional, concorre “Zona de Interesse”, adaptado por Jonathan
Glazer do romance homônimo de Martin Amis (1949-2023) sobre o cotidiano
familiar do nazista Rudolf Höss, comandante nazista do campo de
concentração de Auschwitz.
É admirável que o octogenário
Martin Scorsese conquiste, com o engajado “Assassinos da Lua de Flores”,
sua 10ª indicação ao Oscar de melhor diretor (uma única vitória, e logo
por “Os Infiltrados”, em 2007), batendo assim o recorde anterior de
Steven Spielberg como o cineasta hoje em atividade a concorrer ao maior
número de prêmios na categoria (William Wyler somou 12). Há uma dimensão
poética na possibilidade de o alemão Wim Wenders finalmente obter seu
Oscar por “Perfect Days”, a homenagem a seu mestre Ozu que disputa a
categoria de melhor filme internacional pelo Japão.
Não menos curioso é Wes Anderson
receber sua oitava indicação ao prêmio por um curta-metragem ficcional,
“A Incrível História de Henry Sugar” (Netflix), uma das quatro
adaptações de histórias do britânico Roald Dahl (1916-1990) que lançou
no ano passado. Falando em curtas, entre os finalistas de animação
cumpre comemorar a indicação a “Carta a Um Porco”, um animadoc
franco-israelense de Tal Kandor sobre as memórias de um sobrevivente do
Holocausto, que concorreu no É Tudo Verdade 2023.
Celebre-se, por fim, o feito
sul-americano do ano com a segunda indicação ao Oscar de longa
documental para a cineasta chilena Maite Alberdi, por “A Memória
Infinita”, centrado no impacto dilacerante sobre o cotidiano de um casal
da progressão da doença de Alzheimer. A destacar ainda a predominância
feminina na categoria, com nada menos que três dos títulos finalistas,
somando-se “As 4 Filhas de Olfa”, de tunisiana Kaouther Ben Hania, e “To
Kill a Tiger”, da indiana Nisha Pahuja. A internacionalização é um fato
-e não é mais um clube do Bolinha.