Por Amir Labaki
Com a abertura nesta sexta (29) da
61ª edição do Festival de Cinema de Nova York e na próxima quinta (4)
do 67º. Festival BFI de Cinema de Londres, completa-se o circuito dos
grandes eventos cinematográficos generalistas do hemisfério norte do
segundo semestre, que, somados aos festivais de Veneza, Telluride e
Toronto deste setembro, são reconhecidos como estratégicos para o
posicionamento de concorrentes para o Oscar de melhor documentário de
longa-metragem. Ainda falta pouco mais de um mês e meio para o
encerramento do prazo de inscrições visando a disputa, com as seleções
ainda em andamento para duas plataformas influentes de festivais
exclusivos para filmes não-ficcionais na agenda de novembro (o IDFA, de
Amsterdam, e o DOC NYC, de Nova York), mas a imprensa especializada dos
EUA já adianta as primeiras relações de títulos bem-posicionados para a
disputa.
Variety, The Hollywood Reporter e
IndieWire fizeram suas apostas iniciais na semana passada. Doze
documentários encontram-se nas três listas. Um único aparece no grupo de
favoritos do trio: “O Túnel dos Pombos”, em que Errol Morris (Sob a
Névoa da Guerra, Oscar de 2003) investiga, a partir da última longa
entrevista filmada com John le Carré (1931-2020), a vida e a obra do
grande mestre britânico dos romances de espionagem (O Espião Que Saiu do
Frio). A estreia em streaming mundial, pela Apple TV, não tarda (20 de
outubro).
Três outros retratos de artistas
foram destacados, com ênfase variada, por essas publicações. Tanto
Variety quanto IndieWire posicionaram entre os filmes do topo de suas
listas “Little Richards – Eu Sou Tudo”, biografia do pioneiro
afro-americano do rock n’roll dirigida por Lisa Cortez. Já disponível
pela Apple TV, “Still – A História de Michael J. Fox”, de Davis
Guggenheim (Uma Verdade Inconveniente, Oscar de 2006), retrata o impacto
do diagnóstico do mal de Parkinson no cotidiano e na carreira do astro
de “De Volta Para o Futuro”. Ambos tiveram suas estreias brasileiras na
competição internacional do É Tudo Verdade deste ano.
O terceiro documentário sobre
artista, “Anselm” sobre o artista plástico alemão Anselm Kiefer, pode
valer a quarta indicação na categoria a Wim Wenders. Em nenhuma das
vezes anteriores, por “Buena Vista Social Club” (1999), “Pina” (2011) e
“O Sal da Terra” (2014, codirigido por Juliano Ribeiro Salgado), Wenders
levou o Oscar -aliás, jamais a Academia o premiou.
Também com um posto no pelotão
principal da IndieWire e The Hollywood Reporter, “Kokomo City”, da
estreante trans D. Smith, conquistou prêmios de público na Berlinale e
no Sundance (neste, também de inovação) com seu mergulho na vida de
quatro afro-americanas também transgênero profissionais do sexo. Com
pegada mais ensaística, o escritor e filósofo trans espanhol Paul B.
Preciado estreia na direção em “Orlando, My Political Biography”
discutindo a comunidade trans inspirado pelo romance clássico de
Virginia Woolf.
A salutar expansão para além das
fronteiras dos EUA dos acadêmicos votantes na categoria fortalece as
apostas em dois títulos focados em conflitos internacionais. As
primeiras três semanas da guerra da Rússia contra a Ucrânia são
radiografadas in loco por Mstyslav Chernov em “20 Days in Mariupol”. Já
“Bobi Wine: The People’s President”, de Moses Bwayo e Christopher Sharp,
acompanha a campanha presidencial em 2021 do músico pop e ativista
contra o autocrata de Uganda desde 1986, Yoweri Museveni.
Em tom mais intimista, a chilena
Maite Alberti (Agente Duplo) pode conquistar sua segunda indicação ao
Oscar com o delicado e corajoso “A Memória Infinita”, vencedor da
competição de documentários internacionais do Sundance. Nem mesmo a
epidemia de Covid interrompe o registro devastador da progressão da
doença de Alzheimer do jornalista Augusto Góngora em seu cotidiano com a
atriz Paulina Urrutia.
Já dois dos principais
documentaristas afro-americanas dão sequência a suas análises históricas
do racismo nos EUA. Dirigido por Roger Ross Williams (Music for
Prudence, Oscar de curta doc em 2010, codirigido por Elinor Burkett),
“Stamped from the Beginning” examina séculos de violência
institucionalizada a partir do estudo homônimo de Ibram X. Kendi. Por
sua vez, um capítulo quase desconhecido da segregação no esporte mais
popular norte-americano (o beisebol) vem à luz em “The League”, de Sam
Pollard.
Por fim, mas não por último, “De
Tirar o Fôlego”, de Laura McGann, disponível na Netflix, completa a
dúzia de potenciais concorrentes de Variety, The Hollywood Reporter e
IndieWire. Acompanham-se o fascínio pelas profundezas do mar e pelos
desafios ao corpo de dois adeptos do mergulho livre. É melhor evitar
spoilers.
Considere o cruzamento de
previsões acima não como uma lista de chegada, mas como uma bela relação
de partida. Em 21 de dezembro serão anunciados os 15 semifinalistas.
Sim, já estamos em plena corrida pelo Oscar.