Por Amir Labaki
Assim como para a disputa de
melhor filme, parece ainda francamente aberta a competição pelo Oscar de
melhor documentário de longa-metragem deste ano. As primeiras
indicações não-ficcionais, como a Short List do DOC NYC e os
concorrentes às várias categorias do Critics Choice Award (CCA), ambos
anunciados na semana passada, confirmam o equilíbrio.
Apenas cinco documentários
coincidem em ambas as listas principais. Todos já foram exibidos no
Brasil. Em cartaz na corrente 46ª Mostra Internacional de Cinema de São
Paulo, o canadense “Fire of Love”, de Sara Dosa, é um retrato póstumo de
arquivo de um casal de vulcanologistas franceses, Maurice and Katia
Krafft. Lancado em Cannes e já exibido no circuito nacional, “Moonage
Daydream”, de Brett Morgen, convida-nos a um mergulho caleidoscópico nos
arquivos inéditos de David Bowie.
Premiado no Sundance e concorrente
no É Tudo Verdade deste ano, “Navalny”, de Daniel Roher, acompanha como
um thriller a tentativa de assassinato por envenenamento e posterior
prisão de um dos líderes da oposição a Vladimir Putin, Alexei Navalny.
Também distinguido no Sundance, com o Prêmio Especial da disputa
americana, acaba de estrear na Netflix “O Último Navio Negreiro”
(Descendant), em que a diretora Margaret Brown retorna à sua cidade
natal, Mobile, no estado sulista do Alabama, para acompanhar a busca dos
destroços do derradeiro barco com escravos africanos a ilegalmente
alcançar as costas dos EUA, em 1860.
Já disponível no HBO Max, “As
Janes: Mulheres Anônimas”, de Tia Lessin e Emma Pildes, recupera as
pioneiras ativistas em defesa do direito da interrupção segura da
gravidez na Chicago do início dos anos 1970. A reversão em julho passado
pela Suprema Corte Americana da liberdade feminina para realizar um
aborto, garantida anteriormente pelo caso Roe vs Wade (1973), acentua o
“timing” do filme de Lessin e Pildes.
Ainda inéditos por aqui, dois dos
mais premiados documentários em festivais neste ano surgem sem surpresa
entre as quinze produções da lista novaiorquina, mas emplacaram apenas
indicações em categorias específicas do CCA. “All That Breathes” (tudo
que respira), do indiano Shaunak Sen, venceu a competição internacional
do Sundance e o Olho de Ouro em Cannes ao seguir o dedicado trato de
pássaros de Nova Déli por uma dupla de irmãos.
Por sua vez, Laura Poitras
conquistou o Leão de Ouro no mês passado em Veneza para “All The Beauty
and the Bloodshed” (toda a beleza e o sangue derramado), a um só tempo
perfil biográfico e registro à quente da militância da fotógrafa Nan
Goldin contra a estratégia de lavagem de imagem da família Sackler,
responsável por um dos grupos farmacêuticos vinculados à fatídica
epidemia de analgésicos opioides nos EUA. Na seleção da CCA, o filme de
Sen concorre entre os documentários de ciência, enquanto o de Poitras
entre os políticos.
Outro campeão de premiações desde o
reconhecimento também no Sundance, logo exibido no encerramento do É
Tudo Verdade, “O Território” de Alex Pritz, sobre a luta da tribo
Uru-eu-wau-wau pela preservação de sua terra no Brasil de Bolsonaro,
encontra-se tanto na seleção de destaques do DOC NYC como entre os
concorrentes a melhor documentário de estreia e melhor filme científico
da CCA. Mais três produções marcam as duas listas.
Entre os filmes políticos,
“Retrograde”, de Matthew Heineman, documenta o último mês de convívio
entre tropas americanas e afegãs antes da catastrófica retirada de
meados de 2021 e a reinstalação do regime do Talibã. Entre os musicais,
além da lisérgica viagem em torno de Bowie, concorrem o obrigatório
“Louis Armstrong’s Black and Blues”, de Sacha Jenkins, em cartaz na
Mostra de SP, e o nostálgico “The Return of Tanya Tucker – Featuring
Brandi Carlyle”, de Kathlyn Horan.
O último título dos 15 mais do DOC
NYC também lembrado pela CCA, na categoria das biografias, é o
engenhoso “Sr.”, em que Chris Smith se une a Robert Downey Jr. (Homem de
Ferro) para celebrar ainda em vida a obra do pai do ator, um cineasta
underground dos anos 1960 e 1970 cultuado entre outros por Paul Thomas
Anderson.
Três documentários posicionaram-se
no páreo sobretudo com o aval do DOC NYC. Ondi Timoner radicaliza a
pegada crepuscular de “Sr.” ao acompanhar a cerimônia de adeus, por
morte assistida, de seu pai em “Last Flight Home” (último voo para
casa). Uma produtora musical latina está ao centro de “Mija”, de Isabel
Castro, enquanto Rebeca Huntt investiga em “Beba” suas raízes familiares
na República Dominicana e Venezuela.
Notaram como a catástrofe da
pandemia saiu de foco? Surge aqui e ali, no uso de máscaras e em
cuidados especiais de filmagem. Essa dinâmica pode tanto ajudar como
reduzir as chances de um dos brasileiros qualificados a competir ao
Oscar, ao vencer o É Tudo Verdade 2022: “Quando Falta o Ar”, de Ana
Petta e Helena Petta. A lista de quinze pré-finalistas da Academia será
conhecida em 21 de dezembro.