Por Amir Labaki
Estabelecido em 2008 com um prêmio americano para excelência no cinema documentário alternativo ao Oscar, o Cinema Eye Honors revelou na semana passada sua lista principal de indicações para longas-metragens neste ano. Os vencedores serão conhecidos em 9 de janeiro próximo, numa cerimônia em Nova York.
A grande novidade é a expansão na indicação na categoria principal de melhor longa documental para todos os talentos envolvidos na obra, dos tradicionalmente reconhecidos na direção e produção aos principais nomes da equipe técnica e mesmo protagonistas diante da câmera. Sete documentários concorrem ao prêmio principal: “Dahomey”, “Diários da Caixa Preta”, “Filhas”, “No Other Land”, “Olhe nos Meus Olhos”, “Sugarcane” e “Trilha Sonora Para Um Golpe de Estado”. Sinal dos tempos: todos já foram exibidos no Brasil, em festivais ou em streaming.
Há uma evidente ênfase em documentários sociais nesta lista principal. A exceção mais intimista é “Olhe Nos Meus Olhos”, de Lana Wilson, sobre a relação entre médiuns e seus clientes. O comitê responsável pelas indicações é formado por cineastas e selecionadores de documentários para festivais americanos e internacionais, honrando-me a participação há mais de uma década.
“Sugarcane” lidera em indicações, destacado em seis categorias. Dirigido por Julian Brave NoiseCat e Emily Kassie, já premiados na estreia no Sundance pela melhor direção da disputa não-ficcional americana, é uma contundente investigação sobre abusos sexuais e desaparecimentos em internatos católicos para crianças indígenas no Canadá desde meados do século XX.
Fortalece-se, assim, como um dos favoritos ao equilibrado Oscar da categoria, a ser entregue em março de 2025. Cumpre lembrar, porém, que apenas duas vezes na última década (Cidadãoquatro, 2014, e Indústria Americana, 2019) houve coincidência nos prêmios principais, apesar dos respectivos vencedores regularmente apresentarem nas duas listas de finalistas. No ano passado, “20 Dias em Mariupol”, de Mstyslav Chernov, triunfou na disputa da Academia, recebendo o prêmio de produção pelo Cinema Eye, enquanto este teve por grande vencedor “32 Sons”, de Sam Green, que ficou entre os 15 semifinalistas, mas não entre os cinco indicados para concorrer ao Oscar.
Com cinco indicações cada, quatro títulos vêm logo atrás de “Sugarcane” na lista do Cinema Eye Honors. “Dahomey”, de Mati Diop, discute o saque colonial a partir de obras ancentrais da República de Benin. Dirigido por Gary Hustwit, “Eno” é um retrato experimental do músico e multiartista britânico, cuja edição se redefine a cada exibição. “Frida”, da estreante Carla Gutierrez, reconstitui a trajetória da pintora mexicana. Já “No Other Land”, de Basel Adra, Hamdan Ballal, Yuval Abraham e Rachel Szor, documenta a expulsão militar de palestinos da região de Masafer Yatta na Cisjordânia.
Embora ausente da disputa desta vez, o Brasil tem história no Cinema Eye. Apenas na mais recente premiação, em janeiro passado. foram duas premiações. “A Flor do Buriti”, de João Salaviza e Renée Nader Messora, sobre a resistência dos indígenas Krahô, venceu o Prêmio Heterodoxo, concedido à melhor produção com abordagem híbrida entre a ficção e o documentário.
Já Heloísa Passos recebeu pela segunda vez o prêmio de melhor direção de fotografia, neste ano para produções de televisão, por “Nothing Lasts Forever”, de Jason Kohn; em 2008, na edição inaugural, já havia sido distinguida em “Manda Bala” (Send A Bullet), do mesmo diretor, vencedor ainda como melhor filme, um ensaio sobre violência e corrupção no Brasil. Em 2013, “Elena”, de Petra Costa, foi indicado também a melhor direção de fotografia, de Janice D’Avila, Will Etchebehere e Miguel Vassy.
A única categoria do Cinema Eye aberta ao voto popular destaca produções mais voltadas ao grande público. Vale frisar: os seis últimos premiados com o Oscar estavam nesta lista de concorrentes.
Apenas “Sugarcane”, dentre os indicados na categoria principal, obteve uma vaga entre os oito finalistas, após a primeira rodada de votação online com mais de 30.000 participantes pelo mundo afora, pelo site www.cinemaeyehonors.com. Todos também já passaram por festivais no Brasil ou podem ser assistidos em streaming.
No primeiro caso, estão “Copa 71” (É Tudo Verdade 2024) e “Guerra de Porcelana” (48ª Mostra de SP). No segundo, a Netflix exibe “A Extraordinária Vida de Ibelin”, “Filhas”, “Rainha do Everest: No Topo com Lhakpa Sherpa”, “Skywalker: Uma História de Amor” e “Will & Harper”, enquanto “Super/Homem: A História de Christopher Reeve” se encontra no Max. A segunda rodada de votação aberta ao público, atente, se inicia em 8 de dezembro. Me repito, sei: o documentário ficou de todos mais próximo.