Por Amir Labaki
Com a aceleração do anúncio das listas de indicações para prêmios paralelos e de favoritos de curadores, além de previsões por revistas especialistas, foi dada a largada para a disputa do próximo Oscar de melhor documentário de longa-metragem. Os 15 semifinalistas da categoria serão conhecidos em 17 de dezembro, com a revelação dos cinco indicados marcada para um mês depois. A 96ª cerimônia de entrega do prêmio máximo da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood acontecerá em 2 de março próximo.
Cinco títulos saem na frente a partir do topo das relações de cinco dos principais termômetros já disponíveis: em ordem alfabética, os indicados a melhor longa documental do Critics Choice Documentary Awards, os 15 selecionados pelo DOC NYC para sua “Short List” de sua 15ª edição, no mês que vem, e os rankings dos críticos de The Hollywood Reporter, IndieWire e Variety. Esse quinteto, assim como quase todos os concorrentes destacados, já circulou ou está em exibição no Brasil em festivais, em streaming ou mesmo em salas.
Celebrados em todas as listas, dois documentários de jovens pares de realizadores calam fundo, após consagradoras estreias e premiações no Sundance Film Festival de janeiro último. Vencedor do prêmio de público e já disponível no Netflix, “Filhas”, de Natalie Rae e Angela Patton, acompanha um projeto de dança que por mais de uma década visa fortalecer os laços entre garotas afro-americanas e seus pais encarcerados numa prisão de Washington.
Traumas e separações familiares, mas impingidas a gerações de indígenas canadenses, estão ao centro também de “Sugarcane”, de Julian Brave NoiseCat e Emily Kassie (prêmio de direção na disputa de docs dos EUA no Sundance), em cartaz na 48ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Sobreviventes de violências e abusos sexuais revelam os horrores silenciados da experiência num internato católico para crianças de povos originários.
Três produções não americanas são distinguidas em quatro dos levantamentos. No ensaístico “Dahomey”, premiado com o Urso de Ouro da Berlinale 2024, a cineasta francesa Mati Diop discute o saque artístico e cultural das colonizações a partir da devolução em 2021 pela França para a atual República de Benin de 26 obras ancestrais (na 48ª Mostra, logo em streaming no Mubi). Por sua vez, a estreante japonesa Shiro Itô registra em “Diários da Caixa Preta” sua brava luta por justiça diante da agressão sexual sofrida de um famoso jornalista (menção especial no É Tudo Verdade 2024).
Realizado por um coletivo de cineastas israelenses e palestinos, “No Other Land” documenta o cotidiano de truculência militar visando a expulsão da população palestina de Masafer Yatta, região de cerca de 20 vilas no sul da Cisjordânia, para oficialmente dar lugar a um campo de treinamento militar de Israel. O registro da máquina de destruição nos territórios ocupados aproxima dois jovens, o ativista palestino Basel Adra e o jornalista israelense Yuval Abraham (dois dos co-diretores).
Um letreiro perto do fim revela que as filmagens terminaram em outubro do ano passado. E no dia 7 daquele mês o inferno eclodiu na região, com o ataque terrorista do Hamas, o massacre em Gaza pelas tropas de Benjamim Netanyahu dos palestinos em Gaza, o horror, o horror. Premiado como melhor documentário em fevereiro na Berlinale, na primeira de dezenas de láureas mundo afora, “No Other Land” era e não mais era o mesmo filme, da estirpe de marcos como “Promessas de Um Novo Mundo” (2001), “Checkpoint” (2011) e “Cinco Câmeras Quebradas” (2011) na busca humanista da solução de dois Estados soberanos, pacíficos e seguros lado a lado. Ainda com sessões na mostra paulistana, “No Other Land” não havia ainda encontrado distribuidor nos EUA até a semana passada, o que acrescenta mais dificuldades na corrida pelo Oscar.
Presentes em ao menos duas das listas, sete títulos parecem bem-posicionados para a disputa. São “FRIDA” (Amazon Prime), de Carla Gutierrez; o norueguês “Ibelin” (Netflix), de Benjamim Ree; “Guerra da Porcelana” (na Mostra), de Brendan Bellomo e Slava Leontyev; “Super/Homem: A História de Christopher Reeve” (já nos cinemas), de Ian Bonhôte e Peter Ettedgui; “Trilha Sonora Para um Golpe de Estado” (Pandora, no Brasil), de Johan Grimonprez; “Union” (exibido no Ecofalante 2024), de Brett Story e Stephen Maing; e “Will & Harper” (Netflix), de Josh Greenbaum.
“Apocalipse nos Trópicos”, o novo filme de Petra Costa (indicada ao Oscar em 2020 por “Democracia em Vertigem”), sobre o apoio de lideranças evangélicas à trágica ascensão à Presidência de Jair Bolsonaro, está no páreo. Bem acolhido pela crítica ao ser lançado em festivais internacionais de ponta (Veneza, Telluride, Nova York), conquistou citações em posições intermediárias das apostas tanto de IndieWire quanto de The Hollywood Reporter. O único outro documentário latino-americano presente nestas mesmas listas, em posição similar, é “Estado de Silêncio” (já na Netflix), em que o mexicano Santiago Maza radiografa as ameaças à integridade de jornalistas na linha de frente da denúncia à corrupção e ao narcotráfico no país.
As inscrições junto à Academia para concorrer nesta categoria, para a qual o É Tudo Verdade qualifica seus longas vencedores entre os brasileiros (Tesouro Natterer, de Renato Barbieri) e internacionais (Centro e Quatro, de Jonathan Schörnig), encerraram-se há uma semana. A relação completa será conhecida no próximo mês. Tudo indica que será a competição mais acirrada em muito tempo.