Por Amir Labaki
A superprodução de época “Jeanne
du Barry”, da diretora e atriz francesa Maïwenn, inaugura fora de
concurso, na próxima terça (16), o que se anuncia como a mais robusta
edição recente do Festival Internacional de Cinema de Cannes. Entre os
21 títulos concorrentes à Palma de Ouro encontram-se cinco vitoriosos em
edições anteriores (Ceylan, Kore-eda, Loach, Moretti, Wenders) e os
novos filmes de competidores habituais como Wes Anderson, Marco
Bellochio, Catherine Breillat e Todd Haynes.
Presidido pelo cineasta sueco
Ruben Östlund, vencedor no ano passado com a farsa social “Triângulo da
Tristeza”, assim como em 2017 com “The Square: A Arte da Discórdia”, o
júri discutirá uma seleção com um recorde de sete diretoras na disputa.
Encontram-se entre elas veteranas como a ítalo-francesa Alice Rohrwacher
(La Chimera) e a francesa Catherine Corsini (Le Retour) e uma debutante
em longas-metragens, a franco-senegalesa Ramata-Toulaye Sy (Banel &
Adama).
Noutra raridade, dois
documentários foram incluídos na competição principal. A tunisiana
Kaouther Bem Hania participa pela primeira vez da disputa como um
híbrido entre documentário e ficção, “Les Filles d’Olfa” (As Filhas de
Olfa). Um dos principais documentaristas em atividade, o chinês Wang
Bing, também estreia em competição, com “Qing Chun” (Juventude), e lança
um segundo título entre os programas especiais, “Man in Black” (Homem
de Preto).
Assim como o mestre de “A Oeste
dos Trilhos” (2002), Wim Wenders também emplaca dupla participação,
concorrendo com o drama “Perfect Days” e exibindo também entre os
programas especiais seu retrato do artista visual alemão Anselm Kiefer,
“Anselm”. Os documentários de Bem Hania, Wang e Wenders concorrem ainda
ao Olho de Ouro de melhor filme não-ficcional de Cannes 2023, ao lado de
obras do britânico Steve McQueen (Occupied City) e do brasileiro Kléber
Mendonça Filho (Retratos Fantasmas).
Ao lado do ensaio sobre os cinemas
de rua do Recife, mais cinco filmes de cineastas brasileiros farão sua
estreia na Croisette, além de duas coproduções pontuais. Depois da
vitória com “A Vida Invísivel” na mostra Um Certo Olhar de 2019, Karim
Aïnouz (A Vida Invisível) concorre à Palma de Ouro com seu primeiro
filme em língua inglesa, a produção britânica “Firebrand”, sobre o
conturbado casamento de Henrique V (Jude Law) e Catherine Barr (Alicia
Vikander).
Co-dirigido pelo diretor português
João Salaviza e pela cineasta brasileira Renée Nader Messora, “A Flor
do Buriti”, sobre um massacre dos Krahô no norte de Tocantins dos anos
1940, disputa a segunda disputa oficial de Cannes na mostra Um Certo
Olhar. A competição da Cinéfondation para curtas-metragens realizados em
escolas de cinema selecionou “Solos”, de Pedro Vargas da FAAP de São
Paulo.
O longa-metragem de estreia da
brasileira Lillah Halla, “Levante”, sobre o direito ao aborto, é um dos
concorrentes da 62ª Semana da Crítica, uma das tradicionais mostras
paralelas do festival. Cannes Classics celebra o diretor de “Vidas
Secas” e “Memórias do Cárcere” com a estreia mundial de “Nelson Pereira
dos Santos –Vida de Cinema”, de Aída Marques e Ivelise Ferreira. Mais
uma vez, a presença brasileira inclui a honrosa participação do É Tudo
Verdade entre os festivais parceiros na organização do Cannes Docs pelo
Mercado do Filme do festival.
Para além das disputas, Hollywood
retorna com tudo a Cannes. Sessões especiais fora de concurso estendem o
tapete vermelho para as estreias mundiais de “Indiana Jones e o Chamado
do Destino”, com James Mangold substituindo Steven Spielberg na direção
da quinta aventura da série, e do drama criminal “Assassinos da Lua das
Flores”, dirigido por Martin Scorsese a partir do best-seller
não-ficcional de David Grann, publicado no Brasil pela Companhia das
Letras. A honra da sessão de encerramento caberá à animação “Elementos”,
realizado para a Pixar por Peter Sohn, e a Palma de Ouro pela Carreira
será entregue ao ator e produtor Michael Douglas.
O cinema de autor tampouco ficou
para trás da seleção “hors concours” coordenada pelo diretor geral
Thierry Frémaux. Uma homenagem especial em Cannes Classics homenageia
postumamente Jean-Luc Godard (1930-2022), incluindo o lançamento do
trailer de um filme que não terminará, “Drôles des Guerres”.
Trinta anos depois de seu último
longa-metragem, ninguém menos que o espanhol Victor Erice (O Espírito da
Colméia) volta ao festival com “Cerrar los Ojos”, programado no ciclo
Cannes Première, o mesmo do novo drama de época do japonês Takeshi
Kitano, “Kubi”. Ganham ainda projeções especiais dois novos
curtas-metragens, o faroeste “Estranha Forma de Vida”, de Pedro
Almodóvar, e “As Filhas do Fogo”, de Pedro Costa.
O estrondoso lançamento no
festival do ano passado de “Top Gun: Maverick”, de Joseph Kosinski, com
toda uma jornada consagrada a Tom Cruise, já é reconhecido como um dos
impulsos essenciais para a retomada do grande público às salas de cinema
pós-pandemia. Tomara a impressionante agenda de Cannes 2023 tenha
similar impacto para a recuperação das ainda combalidas bilheterias do
cinema de autor.