Por Amir Labaki
Nada menos que cinco brasileiros estão entre os destaques da 16ª edição do Cinema Eye Honors (CEH), a principal premiação independente para documentários nos EUA. O feito deve-se a duas produções: “The Territory”, de Alex Pritz, e “Mato Seco em Chamas”, de Adirley Queirós e Joana Pimenta. Os vencedores serão anunciados em 12 de janeiro próximo em cerimônia no Museum of the Moving Image em Nova York.
Oficialmente denominado “The Cinema Eye Honors for Nonfiction Filmmaking”, a distinção surgiu em 2008 como uma iniciativa de documentaristas americanos visando o estabelecimento de um reconhecimento anual de escopo mais amplo do que os dos critérios de então para a disputa do Oscar de melhor documentário de longa e de curta-metragem. Desde então uma ampla reformulação sofisticou e internacionalizou o processo de indicação das categorias pela Academia, simultaneamente à consolidação do prestígio do Cinema Eye Honors. Honra-me explicitar que, desde então, o É Tudo Verdade foi convidado pela Academia para se tornar um festival classificatório para o Oscar de seus vencedores brasileiro e internacional, de longa e de curta-metragem, e me tornei há pouco mais de uma década, ao lado de curadores de outros festivais internacionais de documentários, membro do comitê de votantes para o prêmio independente.
A dinâmica virtuosa do processo aproximou as listas de premiados das duas competições. Como lembrou na semana passada um artigo de Marcus Jones na revista especializada Indiewire, “nos últimos cinco anos, 92% dos indicados ao Oscar de melhor longa documental foram também indicados ao Cinema Eye e 88% dos indicados ao Oscar receberam múltiplas indicações pelo Cinema Eye”.
Celebrado nesta coluna quando de seu lançamento nacional em setembro, após ter sido premiado em janeiro no Sundance e ter encerrado em abril a edição deste ano do É Tudo Verdade, “The Territory” é um dos mais contundentes documentários recentes sobre o ataque às terras indígenas durante a presidência Bolsonaro. Uma co-produção internacional envolvendo Brasil, Dinamarca e EUA, adquirida pelo canal por assinatura National Geographic, o filme é dirigido pelo estreante americano Alex Pritz, com estreito engajamento na realização de jovens da comunidade indígena uru-eu-wau-wau de Rondônia.
Tanto é assim que Tangãi uru-eu-wau-wau divide com Pritz a indicação pela melhor direção de fotografia pelo CEH. Também entre os indicados, nas categorias de melhor filme e melhor produção, encontra-se o produtor brasileiro Gabriel Uchida. Na categoria não-competitiva de grandes personagens do ano, batizada “The Unforgetables” (Os Inesquecíveis), destacam-se o jovem líder indígena Bitaté uru-eu-wau-wau e a veterana ativista Neidinha Barbosa, reverenciados ao lado de protagonistas como o militante oposicionista russo Alexei Navalny (Navalny) e a cantora irlandensa Sinead O’Connor (Nothing Compares).
“The Territory” conquistou nada menos que sete indicações ao CEH 2022: melhor filme, produção, filme de estreante, prêmio do público, fotografia, edição e trilha. No mesmo número de categorias foi também indicado o documentário canadense “Fire of Love”, de Sara Dosa, sobre o casal de vulcanistas Katia e Maurice Krafft, premiado pela edição no Sundance deste ano e exibido pela recente 46ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.
A indicação de “Mato Seco em Chamas” ao prêmio Heterodox do CEH 2022, destinado a produções híbridas entre documentário e ficção, soma-se aos prêmios principais recebidos pelo filme de Queiroz e Pimenta no festival francês Cinema du Réel, e no IndieLisboa. Desenvolvido em torno de episódios de violência policial em Brasília, o filme participa da mostra competitiva do corrente festival da capital federal, que conhece seus premiados neste domingo (20).
Na equilibrada corrida pelo Oscar de melhor documentário de longa-metragem deste ano, “The Territory” e “Fire of Love” surgem como dois dos maiores favoritos, dada a constante presença nas listas de indicados para as principais premiações paralelas do ano. O documentário de arquivo de Dosa saltou um pouco à frente nas apostas por liderar, na semana passada, o rol dos concorrentes da IDA (International Documentary Association), emplacando também uma vaga entre os cinco indicados a melhor filme, enquanto “The Territory” surpreendentemente não conquistou nenhuma indicação.
Em comum na disputa principal do CEH e da IDA, além de “Fire of Love”, encontram-se o indiano “All That Breathes”, de Shaunak Sen, e os americanos “All The Beauty and the Bloodshed”, de Laura Poitras, e “Navalny”, de Daniel Roher. Todos devem estar na lista de 15 semifinalistas a ser revelada pela Academia em 21 de dezembro. A briga vai ser boa.