Por Amir Labaki
O documentário “All You See” (Tudo Que Você Vê), a estreia em longas-metragens da cineasta holandesa de origem iraniana Niki Padidar, inaugura na próxima quarta (9) a 35ª edição do IDFA, o Festival Internacional de Documentários de Amsterdã, Holanda. Até o próximo dia 20 serão apresentadas 277 produções, entre mostras competitivas e informativas, focos temáticos e ciclos especiais, performances em palco e obras de novas tecnologias, além do tradicional mercado Docs for Sale e do 30º. Fórum de co-produção.
O maior evento mundial dedicado à produção não-ficcional vai apresentar treze filmes em sua competição principal, mesclando obras inéditas de cineastas consagrados e jovens revelações. No primeiro grupo encontram-se os dinamarqueses Jon Bang Carlsen (Dreaming Arizona) e Lea Glob (Apolonia, Apolonia), o casal holandês Petra e Petr Lastater (Journey Through Our World), e a sérvia Mila Turajlić (Non-Aligned: Scenes from the Labudović Reels). Há dois concorrentes latino-americanos: o argentino Juan Manuel Bugarín, com “Porto Deseado”, sobre um veterano da guerra das Malvinas, e o uruguaio Juan Ignacio Fernández Hoppe, com o mergulho familiar “El Retrato De Mi Padre”.
Embora fora da disputa principal, é expressiva a participação brasileira, com nada menos que oito títulos entre as demais competições e mostras.” Sinfonia de Um Homem Comum”, de José Joffily, concorre na mostra Frontlight, dedicada a produções investigativas. Na competição experimental Envision, o coletivo mineiro As Talavistas & ela.ltda apresenta “Sessão Bruta”, a partir de quatro anos de registros de uma comunidade LGBTQIA+. “Solmatalua”, de Rodrigo Ribeiro-Andrade, disputa entre os curtas. Com foco em novos formatos, “Paradocs” selecionou “Filme Particular”, de Janaína Nagata.
Do ciclo informativo Mestres participam “Adeus, Capitão”, de Tita e Vincent Carelli, e o híbridos “Mato Seco em Chamas”, de Adirley Queiroz e Joana Pimenta. “Miúcha, A Voz da Bossa Nova”, de Daniel Zarvos e Liliane Mutti, está em Best of Fests. Já programa especial Playing Reality, sobre cruzamento entre documentário e teatralidade, exibe” Moscou” (2009) de Eduardo Coutinho. Em meio a tantas dificuldades para a produção audiovisual no país, não é pouco.
O outro programa especial do IDFA 2022 intitula-se “Em Torno da Masculinidade”, investigando “a problemática construção social que é a masculinidade a partir de uma variedade de perspectivas”. A eclética seleção vai apresentar de retratos clássicos como “Meet Marlon Brando” (1966), de Albert Maysles, David Maysles e Charlotte Zwerin, ao estudo de jovens militares em “Crazy” (1999), um dos filmes centrais da filmografia da recém-falecida Heddy Honigmann (1951-2022).
A Convidada de Honra é a diretora americana Laura Poitras, que conquistou em setembro o Leão de Ouro da Mostra Internacional da Arte Cinematográfica de Veneza com “All The Beauty and The Bloodshed”, sobre a fotógrafa Nan Goldin. Além de uma retrospectiva de sua produção engajada (Citizenfour; Risk), Poitras apresenta a seleção de seus filmes favoritos no ciclo Top Tem, incluindo “Titicut Follies” (1967), de Frederick Wiseman, e a ficção “Fome” (2008), de Steve McQueen.
Além dos representantes brasileiros acima citados, a mostra informativa Mestres apresenta, entre outros, o novíssimo documentário de Martin Scorsese (e David Tedeschi), “Personality Crisis: One Night Only”, sobre um dos pioneiros do “glam punk”, David Johansen. Na mesma vereda musical, os dinamarqueses Jorgen Leth e Andreas Koefeld investigam a arte do jazz em “Music For Black Pigons”, lançada fora de concurso em Veneza. Entre as estreias mundiais destacam-se “Gumbo Coalition”, da americana Barbara Kopple, sobre duas lideranças contemporâneas na defesa dos direitos humanos nos EUA, e “Look What You Made Me Do”, em que a holandesa Coco Schrijber radiografa três casos de mulheres que mataram seus parceiros em reação à violência doméstica.
Em quase trezentos títulos, o IDFA 2022 funciona mais uma vez como um sismógrafo do mundo atual, entre pesquisas de histórias privadas e investigações de questões públicas. Raros títulos, contudo, abordam a tragédia da pandemia da Covid-19, como o fazem o citado “Journey Through Our World”, na competição, e o búlgaro “A Provincial Hospital”, de Ilian Metev, Ivan Chertov e Zlatina Teneva, no ciclo de destaques dos festivais. Não tenho a resposta, mas me pergunto se já elaboramos mesmo tanto luto.