Por Amir Labaki
O 76º Globo de Ouro bagunçou de vez, no último domingo, o tabuleiro da disputa pelo Oscar deste ano. “Bohemian Rhapsody”, de Bryan Singer, arrebatou o prêmio de melhor drama (além do de melhor ator, para Rami Malek) e desbancou “Nasce uma Estrela”, de Bradley Cooper, considerado até aqui um dos favoritos. Outro potencial concorrente, o drama mexicano “Roma”, manteve-se firme no páreo, com os triunfos como melhor filme estrangeiro e sobretudo de Alfonso Cuarón como diretor.
A dupla premiação para “Rhapsody” e “Roma” foi contudo superada pelo grande vencedor da noite, “Green Book: O Guia”, de Peter Farrelly, sobre o convívio nas estradas do então ainda segregado sul dos Estados Unidos, nos conturbados anos 60, entre um pianista negro (Mahershala Ali, de “Moonlight”)) e seu chofer (Viggo Mortensen). “Green Book” parte fortalecido na corrida pelo Oscar com as premiações como melhor comédia ou musical, melhor roteiro e ator coadjuvante (Ali).
Falando em reversão de expectativas, o concorrente com maior número de indicações (6) pela Associação dos Jornalistas Estrangeiros em Hollywood, a sátira política “Vice” de Adam McKay, sobre o ex-vice-presidente Dick Cheney, comemorou apenas uma vitória, a de Christian Bale como melhor ator em comédia ou musical. Concorrendo em cinco categorias, “Nasce uma Estrela” também ganhou em apenas uma: ironicamente, o prêmio de melhor canção para “Shallow”, interpretada e co-escrita por Lady Gaga.
Bradley Cooper foi batido por Marek (o Freddie Mercury de “Bohemian Rhapsody”) na disputa de melhor ator e por Cuarón na de melhor diretor. Lady Gaga, por sua vez, foi superada como melhor atriz por Glenn Close, protagonista de “A Esposa”, de Björn Runge, lançado ontem por aqui.
Sem jamais ter vencido o Oscar, Close deve receber no próximo dia 22 sua sétima indicação e liderar as apostas na categoria, tendo como principal rival não mais Gaga, mas sim a britânica Olívia Colman, vencedora do Globo de Ouro de melhor atriz em comédia ou musical no papel da rainha Anne de “A Favorita”, dirigido pelo grego Yorgos Lanthimos.
Das três outras produções com foco em questões afro-americanas, a adaptação por Barry Jenkins do romance “Se A Rua Beale Falasse” de James Baldwin (1924-1987) foi a única a ser distinguida, com o prêmio de atriz coadjuvante para Regina King (Ray). O campeão de bilheterias “Pantera Negra”, de Ryan Coogler, e “Infiltrado na Klan”, o melhor Spike Lee em duas décadas, saíram injustamente de mãos abanando.
A premiação nas categorias de TV buscou o mesmo equilíbrio da cinematográfica entre tradição e revelação. Em sua última oportunidade, o Globo de Ouro fez história ao reconhecer como melhor série dramática a temporada final de “The Americans” (FX), o sutil e complexo mergulho no cotidiano dos anos finais da Guerra Fria criado por Joseph Weisberg. A nostalgia parece ter falado alto na consagração, como melhor série cômica, de “O Método Kominsky” (Netflix), do veterano Chuck Lorre, valendo ainda o prêmio de ator a seu protagonista, Michael Douglas.
Também duplamente premiada foi “American Crime Story: O Assassinato de Gianni Versace” (FX), criada por Tom Rob Smith. Repetindo o Emmy, foi eleita como melhor minissérie e, numa das surpresas (e injustiças) da noite, teve Darren Criss (Glee) escolhido como melhor ator, no papel do assassino do estilista, Andrew Cunanan.
Outro triunfo inesperado foi o do britânico Richard Madden como melhor ator em série dramática por “Segurança em Jogo” (BBC/Netflix), de Jed Mercurio. Só devem crescer os rumores de ser um dos favoritos a suceder Daniel Craig após o próximo filme da franquia 007. Tampouco prevista era a vitória como melhor coadjuvante em minisséries e telefilmes do também britânico Ben Whishaw (o Q de “Spectre”) em “A Very English Scandal” (BBC/Amazon), sob a direção do grande Stephen Frears.
No outro lado da balança, sem surpresas, receberam seus prêmios Rachel Brosnahan como melhor atriz de série cômica por “The Marvelous Mrs. Maisel” (Amazon), Sandra Oh como atriz de série dramática em “Killing Eve” (BBC America/Globoplay), Patrícia Clarkson como melhor coadjuvante em “Sharp Objects” (HBO) e Patrícia Arquette como atriz de minissérie ou telefilme em “Escape at Dannemora” (Showtime). Nenhuma grande polêmica por aqui.
Como previsto, o mais longo e caloroso aplauso da cerimônia saudou a entrega a Carol Burnett do novo prêmio de excelência na TV batizado em seu nome. A montagem com cenas hilárias de sua pioneira carreira foi o único momento em que a velha e boa televisão aberta marcou presença no Globo de Ouro. É mesmo o fim de uma era.